sexta-feira, 19 de outubro de 2012

"A revolta das bactérias"

Caros,
em razão do encontro com as atuais reflexões, colaciono "parte" da coluna semanal do Prof. LENIO STRECK no CONJUR, publicada ontem.

Vale a pena, a leitura e a reflexão.

Quem quiser lê-la na íntegra, acesse
 
Prof. Matzenbacher


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A revolta das bactérias
Mientras tanto, como pensar que “agora vai”? O julgamento do mensalão deve estar provocando “pensamentos mágicos” na população, a ponto de os próprios ministros estarem preocupados com o uso descontextualizado de algumas teses exsurgidas do julgamento, por exemplo, o problema do conceito de lavagem de dinheiro (lembremos a discussão levantada pelo Min. Marco Aurélio, na sessão do dia 11.10.2012). Parcela mais moralista da sociedade — e não estou dizendo que esta não esteja bem intencionada — acredita em certo imaginário em que as ficções se tornam realidade. É como o sujeito que, ciente de que a caixa de leite só vale até a data X, toma-a um ou dois minutos antes da meia-noite, como se as bactérias que azedarão o leite estivessem convocadas para uma assembleia geral à meia-noite e um segundo. Ou o pai, positivista da cepa, que, na praia, instrui seu filho para que somente se banhe na parte da praia que fica do lado não poluído, uma vez que há uma corda separando os “dois tipos de água”...
Quando foi proclamada a Constituição de 1988, alguém pensou que, no dia seguinte, os professores passassem a fazer “filtragem” do velho ordenamento, falando da “relação texto-norma”, “recepção”, etc.? Ora, passados 24 anos e na maioria das salas de aula nem isso fazem.[2] Hoje, o que vemos é a proliferação de literatura jurídica de quinta categoria. Permito-me repetir uma frase (nada mais inédito do que o que já foi publicado, como diz bem Umberto Eco) de mais de década: parcela considerável do material didático utilizado nas salas de aula das Faculdades de Direito e dos cursinhos de preparação deveria ter uma tarja, igualzinha a das carteiras de cigarro, abaixo da fotografia de um utente com cara de besta: “O uso constante desse material fará mal a sua saúde mental”. Ou alguém pensa que haverá um novo amanhã ou um hoje renovado, quando, até mesmo nas Faculdades de Psicologia, estuda-se com resumos? Sim, meninos e meninas, eu vi um desses nas mãos de uma aluna de Psicologia: resumo da Gestalt... Pensei: estamos perdidos. Se eu encontrar um estudante de Medicina com um resumo do tipo “fibrilação atrial simplificada” (eu sou um fibrilado crônico), fugirei para a Ilha do Robinson Cruzoé, levando um Código Civil debaixo do braço... Vai que cheguem outros náufragos e eu necessite lhes dizer que “a ilha tem dono”... E que teve um aluvião... (ou seria “uma aluvião”? há professores que discutem isso em sala de aula – trata-se de um instituto hermafrodita). E invocarei a enfiteuse... Enfim!
Em síntese: Não há mágica a ser feita. Trata-se de um longo processo de aprendizado e insistência em alguns pontos que tocam a fundo nas origens do problema que assola o país. Nos mais diversos campos. De tantos séculos de latifúndio e práticas patrimonialistas até os dias de DM (depois do mensalão)... Este é o fardo a carregar. Nesse fardo, inclua-se o decreto que a ministra da Cultura “baixará” sobre “projetos exclusivamente para negros” (se é “só para negros”, então não há cotas, pois não?). Logo, logo, haverá edital do CNPq, na mesma linha. A ministra fará escola. Pois é.
Por isso, Luis Alberto Warat perguntava: Por quien cantan las sirenas? As sereias cantariam por quem? São tantos os cantos...!
(grifos meus)