segunda-feira, 25 de abril de 2011

JUIZ rejeitou. MP recorreu. TJ proveu. STJ negou. STF resolveu.


Caros,
abaixo, segue uma decisão de lavra do decano do STF, Min. CELSO DE MELLO, reconhecendo a insignificância num crime de furto qualificado na modalidade tentada (HC 107973). O simples caso nos possibilita fixar cinco elementos: 1) a possibilidade de concessão de liminar em habeas corpus (ainda hoje há tribunais que não aceitam por falta de previsão legal!); 2) a impetração da ação autônoma de impugnação diante do recebimento da denúncia pelo tribunal em sede de recurso (in casu, recurso em sentido estrito) diante do não recebimento da denúncia; 3) o habeas corpus aqui serve como instrumento possível de trancar o processo e não a ação(!); 4) a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância mesmo antes do recebimento da denúncia; 5) o afastamento da reincidência como elemento impedidor do reconhecimento da insignificância.
E convenhamos, foi necessário o caso chegar até o STF para "resolver" aquilo que o próprio Juiz de Direito já tinha feito quando do oferecimento da denúncia: a rejeitado.
Ai eu pergunto: temos um SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL?


Prof. Matzenbacher


DECISÃO:

O exame da presente impetração evidencia a relevância da fundamentação jurídica nela exposta, o que permite reconhecer a presença, na espécie, do pressuposto concernente ao “fumus boni juris”, eis que as “res furtivae” - segundo sustentado pela impetrante – corresponderiam, em valor, no máximo, à importância de R$ 78,20 (setenta e oito reais e vinte centavos)!!!

Assinalo, ainda, por relevante, que, por tratar-se, no caso, de furto qualificado em sua modalidade tentada, inexistiu qualquer ato de violência física (“vis absoluta”) ou de violência moral (“vis compulsiva”) contra a pessoa da vítima.

Torna-se claro, presente esse contexto, que se mostraria aplicável, ao caso, o princípio da insignificância, considerando-se, para tanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 192/963-964, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 84.687/MS, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 88.393/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 92.438/PR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – HC 92.744/RS, Rel. Min. EROS GRAU – RHC 89.624/RS, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – RE 536.486/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 550.761/RS, Rel. Min. MENEZES DIREITO, v.g.), mostrando-se irrelevante, de outro lado, a circunstância de o paciente ostentar a condição de reincidente, eis que essa particular situação de natureza pessoal não basta para descaracterizar, só por si, a evidente ausência de tipicidade penal do fato insignificante (HC 106.679-MC/AC, Rel. Min. GILMAR MENDES):

“O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL.

- O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina.
Tal postulado – que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público.

O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: ‘DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR’.

- O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade.
O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social.” (HC 92.463/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Sendo assim, e em juízo de estrita delibação, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o curso do Processo-crime nº 001.08.017450-8, ora em tramitação perante a 1ª Vara Criminal da comarca de Rio Branco/AC.

Comunique-se, com urgência, encaminhando-se cópia da presente decisão ao E. Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.174.660/AC), ao E. Tribunal de Justiça do Estado do Acre (Recurso em sentido estrito nº 2008.003268-5) e ao MM. Juiz de Direito da 1ª Vara

Criminal da comarca de Rio Branco/AC (Processo- -crime nº 001.08.017450-8).

Publique-se.

Brasília, 14 de abril de 2011.


Ministro CELSO DE MELLO

Relator