quinta-feira, 10 de março de 2011

NOVA SÚMULA STJ (471)

Caros,
o STJ editou no dia 28/02/2011 a Súmula 471, que possui a seguinte redação: OS CONDENADOS POR CRIMES HEDIONDOS OU ASSEMELHADOS COMETIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 11.467/2007, SUJEITAM-SE AO DISPOSTO NO ART. 112 DA LEI 7.210/1984 (LEI DE EXECUÇÃO PENAL) PARA A PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL.
Inicialmente, parece correta a edição da súmula, afim de evitar recursos repetitivos sobre o mesmo assunto, ao passo que a matéria sumulada vem ao encontro de ensejar eficácia a um direito fundamental do condenado. A um, porque adotamos o sistema progressivo para a execução da pena privativa de liberdade. A dois, porque vigora o princípio da legalidade penal em nosso ordenamento (art. 5º, XXXIX, CF/88). A três, porque também vigora o princípio da irretroatividade da "lex gravior" (art. 5º, XL, CF/88).
Entretanto, ouso discordar da maneira como a matéria foi sumulada. E isso porque, o nosso constituinte originário também determinou (e impôs ao legislador penal) como direito fundamental o tratamento diferenciado aos crimes hediondos e equiparados, nos termos do artigo 5º, inciso XLIII, da Carta Magna. Para mim, a matéria não parece uma aplicação lógico-matemática da soma aritmética de um mais um obtendo o resultado dois (1 + 1 = 2).
Estou plenamente ciente de que existiu uma lacuna, sem regra específica, para tratar a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos antes da publicação da Lei 11.467/2007. Contudo, a falta de regra específica para esse caso não autoriza a aplicação da regra geral sem quaisquer questionamentos. Posso estar enganado, mas me parece que a classificação de crimes hediondos (e equiparados) foi feita pelo constituinte originário, justamente para que os autores desse tipo de crime tenham um tratamento diferenciado por parte do legislador penal. E mais, no momento de sentenciar, cabe ao magistrado a análise do caso concreto e aplicar as regras pertinentes tendo como norte a Constituição Federal.
Só que agora, o STJ sumulou a matéria dizendo que crime hediondo é igual a crime comum no que tange à progressão de regime, ou seja, 1 + 1 = 3. Só que no mundo do Direito não existem fórmulas lógicas e pré-fixadas para a hermenêutica jurídica. E uma interpretação simplista nem pode ser chamada de "hermenêutica", pois seria uma ofensa para a jurisdição constitucional. O mandamento constitucional é claro e expresso ao afirmar a necessidade de tratamento diferenciado aos autores de crimes hediondos. Tratar a progressão de regime para o autor de um homicídio qualificado tal como a progressão para um estelionatário é um ultraje à hermenêutica.
E para analisar (seriamente) a questão, só vejo uma interpretação possível a partir de um juízo de razoabilidade que leve em conta a dupla face do postulado da proporcinonalidade: proibição do excesso de um lado, e proibição de proteção deficiente de outro.
Vejo a Súmula 471/STJ como um retrocesso para a hermenêutica jurídica e para a jurisdição constitucional brasileira. Essa mania de tratar problemas complexos de forma simplista me irrita. Enfim, acredito que a melhor solução é deixar ao hermeneuta definir um parâmetro mínimo e razoável para conceder a progressão de regime para os crimes hediondos e equiparados cometidos antes da edição da Lei 11.467/2007. Aqui, o ativismo judicial é positivo (desde que o juízo realizado seja proporcional, é óbvio). O princípio (liberal) da igualdade está sendo drasticamente violado, ao passo que não estamos tratando de maneira desigual os desiguais. É claro que surgem inúmeros absurdos com exigências esdrúxulas para a progressão de regime prisional de crimes hediondos por magistrados, mas tais (im)posições são justamente desproporcionais. E aí sim, caberia aos Tribunais uma análise apurada do juízo de (ir)razoabilidade proferido pelo magistrado.
Nessa matéria, passou-se do 8 ao 80 sem se pensar. E é isso que critico aqui e agora. Passou-se do "regime integral fechado" para o "regime progressivo comum", olvidando-se da proteção penal imposta pela Constituição Federal. Ou a Constituição Federal "vale-alguma-coisa-para-constituir-a-ação", ou "não-vale-nada-e-não-constitui-nada".
Indico a leitura da obra "A Constituição Penal" do Amigo e Mestre Luciano Feldens, bem como também do livro deste mês de março, "Processo e Hermenêutica na Tutela Penal dos Direitos Fundamentais", do Amigo e Doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira.
Abraços,

Prof. Matzenbacher